VISTOS e examinados estes autos de Agravo de Instrumento nº 1.504.182-4, do Juízo Único da Comarca de Reserva, em que é agravante Luiz Carlos Vosniak e agravado o Ministério Público do Estado do Paraná.
I - Trata-se de agravo de instrumento com pedido de efeito suspensivo, interposto por Luiz Carlos Vosniak, em face da decisão proferida conjuntamente nos autos de Ação Civil Pública por Ato de Improbidade Administrativa nº 0000130-69.2016.8.16.0143 e nº 0000131- 54.2016.8.16.0143, ambos em trâmite perante o Juízo Único da Comarca de Reserva, determinou, entre outras medidas, o afastamento do Chefe do Poder Executivo Municipal, nos seguintes termos:
"Do afastamento do cargo Conforme previsão do artigo 20, parágrafo único, da Lei nº 8.429/1992: A autoridade judicial ou administrativa competente poderá determinar o afastamento do agente público do exercício do cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração, quando a medida se fizer necessária à instrução processual.
Conforme a literalidade da regra, somente será pautado o afastamento do cargo do agente público, quando tal medida mostrar-se necessária à instrução processual.
Trata-se, portanto, de regra limitadora, pois não basta o prejuízo causado pelo agente, não basta um eventual juízo moral em relação aos atos do gestor público, faz-se necessário averiguar se a medida é necessária para fins de instrução processual.
O comportamento do agente público é de suma importância para a análise desta possibilidade de prejuízo à instrução processual, pois se de um lado as evidências demonstrarem a sua colaboração e cooperação no decorrer da instrução civil e dos Procedimentos Preparatórios e Investigatórios perpetrados, não se pode presumir o necessário afastamento.
Mas entendo que não é este o caso dos autos.
O cuidado para com tal decisão é extremo, pois trata-se de afastar aquele eleito pelo povo de uma cidade, escolhido de forma democrática e justa, o que conduz a presente decisão à avaliação minuciosa dos fatos, que passo à análise.
Observa-se que durante as investigações civis conduzidas pelo Ministério Público o Requerido por duas vezes dirigiu-se ao órgão fiscalizador.
Na primeira oportunidade, através de ofício, comunicou a exoneração de aproximadamente trinta servidores, a maioria da listagem contida na Recomendação Administrativa nº 002/2015.
Na segunda oportunidade, firmou Termo de Ajustamento de Conduta comprometendo-se a não mais contratar comissionados e exonerar aqueles contidos na Recomendação Administrativa nº 002/2015.
Entretanto, e aqui reside o enorme receio quanto à eficácia das investigações civis e instrução processual das presentes demandas, o Requerido agiu de forma ardilosa, pois apresentou uma lista de exonerados, mas menos de um mês após firmado o TAC, com previsão de multa diária pelo descumprimento, iniciou a peregrinação de contratação de comissionados de forma incessante já em 04/11/2015 (Fabiana Araujo Gomes), 17/11/2015 (Michel Staruzcka Pawlak, Nerci Aparecido Ferreira Pontes (07/11/2015), Josinei dos Santos (27/10/2015 - uma semana após firmar o TAC), e continua até os dias atuais 21/01/2016 (Marcia Maria da Silva Lima), Mauricéia Castanha (08/01/2016), José Carvalho da Silva (21/01/2016), entre outros.
Ou seja, a manutenção no cargo do Agente Público denota que o mesmo continuará uma saga interminável de contratações de comissionados, pois é importante lembrar que já há estipulação de multa diária de R$ 1.000,00 (um mil reais), que levada a cabo desde a primeira contratação após ter firmado o TAC (e em afronta à CLÁUSULA PRIMEIRA, (1) e (6), CLÁUSULA SEGUNDA (5) - por exemplo no caso do servidor Egon Henrique da Silva Prezybylski -, CLÁUSULA QUARTA) estaria acumulando aproximadamente R$ 100.000,00 (cem mil reais) a serem pagos pelos cofres públicos, devendo tal valor ser possivelmente retirada da já combalida economia de Reserva-PR.
Ainda, e não menos, observa-se que de maneira extremamente questionável, o Agente Público internamente utiliza-se do expediente do Termo de Ajustamento de Conduta para justificar o prosseguimento de um procedimento licitatório majoritariamente viciado (conforme declarado na Comunicação de Irregularidade ao TCE pelo Controlador do Município) quando questionado em 07/12/2015, entretanto, no dia seguinte (08/12/2015) recontrata comissionado que havia "exonerado" e informado ao Ministério Público através de ofício comunicando cumprimento parcial da Recomendação Administrativa nº 002/2015 (referente ao servidor Marcio Rodrigues - recontratado na aludida data Edição 19410 do Jornal da Manhã, página C3).
Voltando à instrução processual, observo que as duas frentes desaguadas pelo Parquet vêm tendo comprometimento no que tange à possibilidade de averiguação da situação real dos atos questionados manejados pelo Agente Público.
Comissionados: conforme exposto acima, as medidas restritivas dos atos de contratação, visando a adequação em momento imediato, e a quantificação das irregularidades pelo Ministério Público não vêm sendo alcançadas, pois ainda que prevista medida alternativa (multa diária de R$ 1.000,00 (um mil reais), o Requerido não só descumpriu todos os regramentos, como vem dificultando a análise das ilegalidades justamente com a promulgação de Resoluções alterando os cargos comissionados, em uma aparente "dança das cadeiras", com o intuito evidente de dificultar e ludibriar as apurações conduzidas pelo Ministério Público. É importante o destaque aqui que todas as recontratações e novas contratações acima pormenorizadamente detalhadas demonstram o expediente utilizado pelo Requerido.
A verificação de cada comissionado, sua ciência acerca in loco das situações exaradas de irregularidade, bem como, eventual conluio entre aqueles que vêm sendo manejados em cargos ilegais, a disposição estrutural da administração e forma de utilização dos quase cem cargos comissionados não poderão ser averiguados sem o afastamento do Requerido do cargo, pois toda a estrutura aparentemente criada para dificultar a análise destas mudanças vem sendo administrada pelo mesmo.
Concurso Público: conforme bem detalhado pela Controladoria Municipal, o Agente Público não só utiliza do Termo de Ajustamento de Conduta para fazer movimentar um certame que já se encontra eivado de aparentes vícios insanáveis, como não vem observando recomendações e alertas do Tribunal de Contas do Estado, como por exemplo a Informação nº 1150/15 daquele órgão. Poder-se-ia sustentar que, neste caso específico, bastaria a suspensão do certame.
Ocorre que, não há informação sobre, sequer, as atribuições de cada cargo, a razão pela qual as alterações entre minuta e edital ocorreram, ciência pelo Requerido através de documentos da situação de alerta do Município na relação concurso x orçamento. Tais verificações poderão ser feitas na própria Prefeitura, mas é importante destacar que todas as recomendações realizadas tanto pelos órgãos administrativos, quanto pelo Ministério Público foram suplantadas pelo Requerido através de omissões a serem apuradas na instrução processual.
Impacto financeiro: neste ponto reside o problema que, na continuidade do Requerido no cargo, poderá gerar prejuízo incalculável para a comunidade local. Conforme exaustivamente destacado no parecer da Controladoria Interna, várias foram as considerações levadas ao Requerido acerca da situação atual financeira do Município. Entretanto, e a necessidade instrutória engloba as duas frentes analisadas pelo Ministério Público, é impossível, sem uma verificação no interior da Prefeitura de Reserva-PR, parte contábil e recursos humanos, sem influências externas que delimitam até mesmo a atuação do Controlador Interno, estabelecer-se a ordem de impacto financeiro e apuração dos crimes previstos na Lei de Responsabilidade Fiscal, pois simplesmente não há qualquer levantamento de impacto financeiro entre as contas existentes atualmente, e a elevada contratação, seja dos comissionados, seja aquela pretendida através de concurso público, pois não foram realizados tais estudos, conforme repisado.
Destaco ainda, que os atos que vêm sendo realizados, dificultando a averiguação do que ocorre de fato quanto aos três itens acima mencionados, podem ser enquadrados como elementos concretos de convicção acerca do perigo de lesão à regular instrução processual, conforme preconiza o Enunciado nº 27 das 4ª e 5ª Câmaras Cíveis do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná.
A jurisprudência é uníssona quanto à possibilidade de afastamento do cargo do agente em caso de necessidade para instrução processual e mais ainda quando cumulada com prejuízo ao erário: (...) De todo o exposto, DEFIRO o afastamento do Chefe do Poder Executivo da cidade de Reserva-PR, pelo prazo de 90 (noventa) dias, prorrogável por igual período em caso de extrema necessidade, para fins da devida instrução do presente feito, conforme exaustivamente detalhado.
(...) Desta forma, em síntese: - DEFIRO o afastamento do Chefe do Poder Executivo da cidade de Reserva-PR, pelo prazo de 90 (noventa) dias, prorrogável por igual período em caso de extrema necessidade, para fins da devida instrução do presente feito, conforme exaustivamente detalhado. Fica o Requerido impedido de adentrar no edifício da Prefeitura Municipal de Reserva-PR, como medida exclusiva de garantir o bom andamento da instrução probatória, sendo que a referida medida será revista a partir de informação pelo Ministério Público, em quinze dias do primeiro dia útil seguinte à intimação da mesma, sobre a necessidade de manutenção deste impedimento. O impedimento terá eficácia em até quinze minutos após a intimação desta decisão, sendo que o descumprimento acarretará as medidas penais e civis cabíveis;"
Inconformado, o agravante interpôs o presente agravo de instrumento, insurgindo-se apenas contra a parte da decisão que determinou seu afastamento.
Nas suas razões recursais alega, em síntese: a) a inexistência de argumento válido quanto à suposta necessidade de afastamento do prefeito para garantir a instrução processual; b) a decisão se baseia em fundamentos equivocados, pois inexiste risco à instrução processual; c) não houve desrespeito ao Termo de Ajustamento de Conduta firmado pelo agravante perante o Ministério Público; e) o concurso público suspenso liminarmente é parte justamente do cumprimento do TAC; f) a abertura de concurso público não implica na imediata nomeação dos aprovados, o que só será realizado de acordo com a disponibilidade de vagas e possibilidade de contratação nos termos da Lei de Responsabilidade Fiscal.
Pleiteou a concessão do efeito suspensivo ao recurso para o fim de suspender a decisão no que se refere ao afastamento do Prefeito Municipal, determinando a sua recondução ao cargo.
Por fim, pugnou pelo provimento do recurso.
É o relatório.
II - De início, vale observar que o presente agravo de instrumento encontra-se devidamente instruído, com as peças obrigatórias previstas na legislação processual (art. 525, CPC), além de preencher os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, o que possibilita seu exame.
Admito o processamento do recurso sob a forma de agravo por instrumento, uma vez que a situação fática se enquadra em uma das exceções previstas pelo art. 522, do Código de Processo Civil, com sua nova redação dada pela Lei n.º 11.187/2005, qual seja, "decisão suscetível de causar a parte lesão grave ou de difícil reparação".
Insurge-se o Agravante contra a decisão singular que determinou o afastamento do prefeito municipal de Reserva ante os indícios da prática de atos de improbidade administrativa, bem como o receio de haver interferência na instrução processual.
Tem-se que para a concessão do efeito suspensivo, quando do recebimento do recurso de agravo de instrumento, se faz necessário a presença, prima facie, dos requisitos autorizadores da medida de urgência, quais sejam: a relevância da fundamentação e o fundado receio de dano grave e de difícil reparação, nos termos dos artigos 527, inciso III e 558, do Código de Processo Civil.
Logo, em sede de cognição sumária cumpre apenas investigar a retidão da decisão atacada, ou seja, se agiu bem o d.
juízo singular ao deferir a medida liminar pleiteada pelo Ministério Público nas ações civis públicas originárias.
Com efeito, em juízo perfunctório de avaliação, entendo que os argumentos apresentados não se mostram suficientes para a concessão de efeito suspensivo à decisão agravada.
Explico.
O ora agravante assumiu obrigações através do TAC - Termo de Ajustamento de Conduta (fls. 93/105) que visam regularizar a situação de servidores comissionados, dentre outras medidas.
Apesar de ter exonerado alguns dos servidores comissionados que não exerciam funções de chefia, direção ou assessoramento, num juízo de cognição sumária, denota-se que o ora agravante recontratou alguns dessas pessoas para os mesmos cargos, ou cargos similares.
Assim, ao menos nesse momento processual, verifica-se que os atos do agravante não demonstram intenção inequívoca de efetuar a regularização da contratação de servidores municipais e põe em cheque as verdadeiras razões pelas quais alguns deles estariam sendo recontratados.
Observa-se, ainda, o aparente descumprimento das medidas firmadas através do já mencionado TAC e das manobras para manter determinados servidores em cargos comissionados de forma irregular.
Como bem ressaltou o juízo a quo, a instrução processual fica prejudicada na medida em que a "quantificação das irregularidades pelo Ministério Público não vêm sendo alcançadas, pois (...) o Requerido não só descumpriu todos os regramentos, como vem dificultando a análise das ilegalidades justamente com a promulgação de Resoluções alterando os cargos comissionados, em uma aparente "dança das cadeiras".
Ainda, denota-se que a medida foi deferida por um período de tempo razoável, adequado ao caso concreto, em conformidade com a jurisprudência firmada sobre o tema, tendo em vista, ainda, que se trata de medida extrema em relação a um mandato que foi concedido pela soberana vontade popular.
Pelos fundamentos expostos, INDEFIRO a concessão do efeito suspensivo pleiteado no agravo de instrumento.
Ressalta-se que esse posicionamento é tomado, exclusivamente, em sede de análise sumária dos elementos carreados aos autos, não vinculando a decisão final do agravo de instrumento, sendo certo, ademais, a questão será melhor analisada com a apresentação da resposta do agravado.
III - Oficie-se ao Juízo Único da Comarca de Reserva, enviando cópia desta decisão, para que preste as informações que entender necessárias e, manifeste-se quanto ao cumprimento do art. 526 do CPC; IV - Intime-se o agravante da presente decisão.
V - Intime-se o agravado para que responda ao presente recurso no prazo legal.
VI - Após, encaminhem-se os autos a d. Procuradoria Geral de Justiça.
VII - Oportunamente, voltem-me conclusos.
VIII - Autorizo a Chefia da Seção a assinar os ofícios necessários.
Curitiba, 23 de fevereiro de 2016.
LÉLIA SAMARDÃ GIACOMET Desembargadora Relatora
Nenhum comentário:
Postar um comentário